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Aventuras e desventuras de uma mamã de gémeos: Como me meti nesta enrascada; Relatos da (in)experiência; O dia-a-dia com 2 mabecos... Leiam e participem!!
Porque antes de sermos pais eramos namorados fazemos questão de celebrar anualmente a data a dois. E se nos anos anteriores o ‘a dois’ resumiu-se a um jantar (um belo jantar, diga-se de passagem, mas ainda assim apenas um jantar) depois dos miúdos estarem na caminha, este ano, e porque a data era também especial, resolvemos aventurar-nos por terras de Espanha.
Mas quem tem filhos sabe que nestas coisas nada é simples, e por entre doenças à vez (começou o Pandinha, depois eu e para terminar a Patapon) faltava pouco mais de uma semana quando decidimos arriscar e fazer as reservas. Contra toda a lógica de se viajar rápido quando o tempo é escasso, e porque o interesse era fugir da azáfama diária, optámos pela viagem nocturna no Lusitânia Comboio Hotel. Obvio que tão em cima da hora já não havia o alojamento mais barato e por isso tivemos de desembolsar 146eur por uma viagem em Grand Classe, mas deve ter sido dos valores mais bem gastos da minha vida.
Eram 20h00 e já andávamos pela Gare do Oriente meio ansiosos, a pensar o que iria falhar. Por diversas vezes conferimos o bilhete, perguntámos a seguranças e ao pessoal da CP qual a linha e se era necessário mais alguma coisa além das folhas A4 impressas da net (que saudades dos bilhetes à moda antiga!). E não sem uns dias antes nos ter dado um piripaico (como diriam os gestores do Sapo) por constatar que os bilhetes não tinham números contíguos. Sim… eu sei que no comboio, como em tantos outros locais, os pares são ao lado dos pares e os ímpares ao lado dos ímpares, mas nós tínhamos 2 ímpares que não eram seguidos. Foram telefonemas para a CP (que apesar de também vender os bilhetes não sabia informar porque a empresa que gere o Lusitânia é espanhola), e-mails para a Renfe (que nos respondeu que deveríamos escrever em inglês pois não percebem português), até que quase na véspera num telefonema para a linha deles, nos conseguiram desencantar um qualquer estrangeiro com sotaque de leste que falava abrasileirado. Embora não soubesse explicar porquê, garantiu-nos que o compartimento era o mesmo e que eu não teria que dormir com um desconhecido… e eu lá acalmei.
Mas confesso que só às 21h27 em ponto (mais uma vantagem das viagens de comboio é não haver atrasos) ao entregar os bilhete
s ao… bem… não posso chamar simplesmente revisor porque era mais que isso… talvez ‘Gestor de Acolhimento’ (porque aquilo parece MESMO tratamento VIP de Hotel de 5 estrelas) e sermos encaminhados até ao compartimento é que acreditei ser mesmo verdade. Íamos fazer uma viagem de comboio nocturna Lisboa-Madrid durante 10h00 num compartimento exíguo com 2 cadeirões confortáveis que desapareciam por baixo das camas estilo beliche que saíam da parede, e um wc completo colocado em pouco mais de 1m2.
Naquele breve instante ainda pensei… se sobrevivermos a isto, talvez seja possível aguentar o convívio por mais 18 anos.
E no entanto todos os receios desapareceram quando ao perguntar ao tal Gestor ‘‘Como é que as camas saem?’’ me respondeu ‘’Não necessita fazer nada, o bilhete inclui jantar e pequeno-almoço pelo que podem ir para a carruagem-restaurante quando quiserem que o jantar já está a ser servido, e enquanto lá estiverem vem cá alguém preparar o quarto e abrir as camas.’’…e PLIM!! Fez-se luz… estava no céu!!
Chegados à carruagem restaurante já o comboio estava em movimento e nós ainda a tentarmos equilibrar-nos pelo que foi muto agradável acompanharem-nos de imediato ao lugar. O jantar incluía bebidas, pão, café, entrada, prato principal e sobremesa, escolhidos de entre uma meia dúzia de opções, todas elas com uma descrição deliciosa. E eu só pensava como raio é que a garrafa de vinho se iria equilibrar com o balanço…
Apesar da estação do Oriente estar repleta de pessoas que embarcaram para o Lusitânia, a carruagem restaurante ia praticamente vazia, talvez fruto dos preços praticados que me fizeram dar graças pela reserva de última hora nos ter levado a comprar o pacote Grand Classe.
Mas na mesa do lado estava um casal de brasileiros com 2 filhos que, não tendo o menu incluído no bilhete, se queixavam não apenas dos preços como da quantidade de comida. ‘’Mamãe!! Você reparou que dizia brócolo em vez de brócolos? Cá está porquê!’’, dizia o rapaz a apontar para um exemplar isolado daquele vegetal, num canto do seu prato. Apesar do pão quentinho estar divinal barrado com a manteiga, ainda questionei se iriamos passar fome. Mas longe disso… A entrada de tomate e cebola estava simples mas apetitosa, o ‘entrecôte’ era servido numa quantidade generosa e não houve qualquer razão de queixa das deliciosas sobremesas. E sabem o melhor? Apesar dos solavancos que faziam oscilar o vinho nas taças não entornámos qualquer gota!! E tudo isto a viajar com uma paisagem nocturna em constante movimento. Haverá melhor?
Depois de tal repasto e de bebermos calmamente aquele quer seria, provavelmente, o último café de jeito dos próximos dias, recolhemos ao compartimento onde duas caminhas abertas estilo camarata nos aguardavam. Apesar do espaço exíguo eram muito confortáveis, e cerca de 2horas depois já estávamos perfeitamente adaptados aos embalos.
Acordámos noutra terra, com outra paisagem que fazia lembrar o Alentejo. Apressamo-nos a tomar banho naquela que terá sido a casa de banho mais minúscula em que já estive, mas nem por isso deixava de ter todas as comodidades. Desde um kit de higiene que faria envergonhar muitos hotéis de luxo, até secador de cabelo. Tinha de tudo. E tinha um poste no duche, que se numa primeira observação poderíamos pensar ser um acessório para animar a festa, assim que sofríamos o primeiro solavanco ao tomar duche o motivo de tal acessório era mais que evidente. E foi assim, por entre solavancos e abanicos, com uma mão no poste e outra no gel de banho, que lá conseguimos tomar um belo duche e rumar, já completamente restabelecidos, cheirosos e fresquinhos, à carruagem restaurante, onde um farto pequeno-almoço nos aguardava.
Deu para comer calmamente, trocar dois dedos de conversa com o empregado de mesa, e constatar que, a meio da noite, o comboio tinha sido invadido por turistas. Curiosamente, ao contrário do que acontece em Portugal, eram na sua maioria, turistas espanhóis a viajarem por terras de Espanha. Seguíssemos nós este exemplo e talvez a economia nacional não andasse tanto pelas ruas da amargura.
Mais uma vez com a pontualidade de carril lá chegámos a Madrid às 8h10 da manhã, hora local, corrigida em mais uma hora que a portuguesa. A preguicite aguda que me invadia é que não deixava enganar o corpo, de que era bem mais cedo do que aquilo que me tentavam convencer, e foi com muita nostalgia de deixar para trás a caminha de embalo que pusemos o pé na estação de Chamartin.