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Aventuras e desventuras de uma mamã de gémeos: Como me meti nesta enrascada; Relatos da (in)experiência; O dia-a-dia com 2 mabecos... Leiam e participem!!
Ao senhor sapo que quase atropelei pelo caminho peço as minhas mais sentidas desculpas. E não, não falo no sentido figurado, já que um desses bichinhos se atravessou na estrada e me fez guinar o volante e recuar no tempo.
Há muitos muitos anos, quando eu estava a estagiar a mais de 100 kms de casa, calhava de passar por uma zona de grande irrigação fluvial (ai que poética que eu hoje estou), e naqueles quilómetros finais calhava sempre de encontrar algum animal. Os corvos e as cegonhas eram os mais usuais, mas a dada altura encontrei lagostins. E desviei-me, claro!
Pois no dia seguinte em vez de 2 ou 3 tinha a estrada coberta de lagostins. Ao ponto de a cada volta de rodado ouvir aquele 'crrrssssshhhh' característico, como quem martela uma sapateira. Parar não podia, que aquela maltinha tinha ar de quem ia ficar por ali a cirandar todo o dia, e eu tinha quem me esperasse no destino. Outro caminho também não havia pelo que segui em frente, mas sempre de peso na consciência por matar algo que não comesse de seguida.
E tanto isso me perturbou que acabou por ser tema de conversa ao almoço com o meu orientador. Pelos vistos os animais estavam em época de migração e o trajecto passava por aquele local exacto onde resolveram fazer uma estrada. A culpa não seria dos animais, é certo... mas eu confesso que não estava ansiosa por fazer o trajecto de regresso a esmagar mais umas dezenas de... caraças! Aquilo era marisco, certo? De rio, mas marisco! Vai daí lembrei-me de perguntar se era comestível e foi aí que se fez luz. Pelo menos se fosse para matar que comesse, não? Liguei à mamã e ela disse que sim, que sabia cozinhar lagostins de rio, e que o meu pai até apreciava.
Decidida então a transformar os quilómetros seguintes em caçada fiz-me à estrada em final do dia já com a missão estudada. Acontece que no porta bagagens do meu carro sempre andou o triângulo de sinalização, o colete, o extintor, o kit de primeiros socorros, e aquela coisa tão útil em caso de pneu furado (acreditem que já perdi a conta aos que troquei, e quando o nosso primeiro carro é um VISA 10E com uma década dá muito jeito ter tais acessórios) que se chama WD-40, e depois a bisnaga de supergel e o paninho para limpar as mãos. Mas nada de sacos.
Quem não me conhece pode achar que sou pessoa de desistir à mínima contrariedade, mas eu devo ser mais teimosa e determinada que uma mula (talvez seja isso que ainda me faz aguentar), e por isso apanhei-os (sim, à mão, que no fundo aquilo são caranguejos e tal proeza eu estava habituada a fazer nas pescarias com o meu avô e nos pontões das praias da Costa da Caparica) e atirei-os para o porta-bagagens. Dei-lhes uma lição de moral para não estragarem nada ou teriam uma morte lenta (ehehe) e lá prossegui caminho.
Chegada a casa da minha mãe, feliz e orgulhosa com a caçada, esta quebrou-me o raciocínio quando guinchou ao olhar para o porta bagagens.
-Mas vêm vivos!! E à solta!! -dizia ela completamente abismada.
Juro que por momentos aquela não me parecia a mesma mãe que insistiu com uma pirralha de 3 ou 4 anos (eu, portanto) que tinha que tirar as rãs todas que lhe tinha posto cuidadosamente no casaco, enquanto ela e uma amigas andavam a pescar enguias ao cesto (uma bela tradição que espero não esteja esquecida) num regato perto de Leiria. Recordo-me do discurso da altura... de que não as podia levar porque não iam sobreviver. Porque só eram felizes ali, e blá, blá... A mesma mãe que certa vez, a caminho de Serpa, quando fizemos uma das muitas paragens de beira de estrada que a inexistência de auto-estrada e a co-existência de 2 mabecas tolas no banco de trás de um Fiat 124 (nada é suficientemente largo quando duas manas andam à porrada) nos obrigava a fazer, me negou o transporte de uma maria-café que encontrei nas ervinhas. Já devias saber o que a casa gasta, certo??
Vai daí eu, teimosa como sou (não sei se já vos disse isto) liguei para recém sogra (namorava há pouco tempo e por isso imagino a imagem com que ela ficou a meu respeito logo nessa altura) que disse que sim, os sabia cozinhar (desconfio agora que esta deve ser a resposta pronta de mãe, tipo 'Claaaaaro que sim! Sei cozinhar isso e muito mais.'). E lá incertei eu novamente caminho, não sem antes a minha mãe ter insistido para pelo menos os levar numa panela, que o meu pai apertou com sisal, de forma a que a tampa não saltasse.
Pois... mas em casa da sogra o cenário não foi diferente, e alguns gritinhos depois, decidi fazer eu o petisco. Não estava mal, mas tenho a reter que os lagostins de rio precisam de bem mais sal que os outros...
E assim, depois desta derrapagem pela maionaise, voltámos ao presente, onde o co-irresponsável garante que nenhum sapo ficou ferido no decorrer desta história. Já eu... não tenho tanta certeza. Acho que simplesmente o meu gajo ainda gosta de mim o suficiente para me pregar uma mentira piedosa ou impedir-me de voltar atrás para desviar o sapo do caminho. Não sei porquê... prefiro pensar que está tudo bem com o sapinho, e que apenas levou um valente susto, e uma repreensão da mamã dele por ter atravessado a estrada sem olhar.