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Aventuras e desventuras de uma mamã de gémeos: Como me meti nesta enrascada; Relatos da (in)experiência; O dia-a-dia com 2 mabecos... Leiam e participem!!
"A felicidade, em Portugal, é considerada uma espécie de loucura. Porquê? Porque os Portugueses, quando vêem uma pessoa feliz, julgam que ela está a gozar com eles. Mais precisamente: com a miséria deles. Não lhes passa pela cabeça que se possa ser feliz sem ser à custa de alguém.", Miguel Esteves Cardoso, Os Meus Problemas (aqui na versão reeditada de 2016).
Ora aí está uma grande verdade! Confesso que é dos meus autores preferidos e talvez por isso comece desta forma mais um post, mas por muito que tentasse eu não diria melhor. Ser feliz em Portugal, sobretudo nos tempos que hoje correm não é normal. Não termos queixas constantes dos miúdos, da vida, do trabalho, não é normal.
E é tanto mais assim quando se tem putos, e é tanto mais assim quando se tem putos pequenos.
Se de início achava natural que me perguntassem como estavam os bebés, se comiam bem, se faziam cocó (esta reconheço que ainda acho um pouco estranho), e se dormiam a noite toda, ao fim de vários meses de não me queixar em demasia (porque enfim... para mim acordar de 3 em 3h durante aqueles primeiros meses era o preço normal a pagar pela prematuridade, e as cólicas e prisão de ventre parece que fazem parte daquele período inicial de adaptação, e não beberem sempre os 150ml de leite para mim não era problemático pois não estava a fazer nenhuma receita de pão de ló) comecei a notar que as pessoas olhavam para mim de uma forma estranha.
E fica ainda pior quando me perguntam se custou muito o parto e eu respondo que correu tudo bem, se custou muito o pós parto e eu digo que não. E juro que não estou a mentir. 'Foi uma sorte!', costumo ouvir logo de seguida. Sim e... não! Sim, correu tudo bem. Sim, poderia ter havido complicações. Mas também fiz o possível e o impossível para que não houvesse. Claro que há depois sempre o factor X, Y e Z que não depende de nós, mas na parte que depende cumpri à risca. E isso ajuda, certo? Senão é como a história do outro que espera ganhar o euromilhões mas nunca joga...
Se as coisas podiam ter corrido melhor? Sim. Escusava de ter receado pela vida deles quando tive um acidente de carro nos primeiros meses de gravidez. Escusavam de estar 9 dias na NEO, escusava de ter de vir para casa de braços a abanar e a stressar com o leite, escusavam de ter nascido prematuros e assim o Pandinha provavelmente não teria refluxo gástrico durante quase 14 meses.
Ao longo destes quase 6 anos temos tido altos e baixos. A Patapon teve uma infecção urinária que quase a levou a ser hospitalizada; o Pandinha aos dois anos de idade furou a cara de um lado ao outro com um livro e teve que ser cosido no hospital, com a mãe e o pai a terem de segurar porque uma das enfermeiras não teve coragem, e há cerca de 2 meses atrás teve de repetir a experiência (mesmo antes das férias de Verão, claro) ao abanar um daqueles bancos da IKEA de 4 patas rechonchudas até aterrar de queixo na mesa da sala e ter de levar mais 4 pontos (e tudo porque não queria ser o primeiro a tomar banho); temos gasto fortunas em médicos e exames por causa da sintomatologia alérgica do Pandinha, e tanto eu como o pai a nível pessoal e profissional temos passado por momentos mais complicados. Também com o resto da família, e mesmo a nível de saúde as coisas poderiam correr melhor, que a malta agradecia. Mesmo antes dos miúdos nascerem as coisas não eram fáceis para ninguém.
Por isso sim, somos uma família normal, a que acontecem todos esses precalços da vida. Que também tem dias complicados, e semanas e meses... Não seremos é pelos vistos normais na forma como os abordamos.
Claro que poderia andar por aí a chorar pelos cantos, de ar tristonho e cabisbaixo por tudo aquilo que não corre bem. Mas eu não sou assim. Mesmo porque não adianta nada, certo? Não resolve nada!
Sim, também choro de vez em quando e q.b.. Mas se há quem tenha grandes depressões, eu costumo dizer que, quanto muito, tenho depressinha. Simplesmente porque não tenho tempo nem paciência para andar a choramingar muito tempo. Tenho mais e melhor para fazer, percebem? Tenho quem precise e dependa de mim. E não lhes posso falhar. E não ME posso falhar!
Se a vida podia ser melhor? Podia, claro! Podia não andar a fazer contas para o dinheiro chegar até ao fim do mês (sim, aqui também estamos a sentir os efeitos da crise), podiamos estar todos saudáveis o tempo todo, podia não se avariar tanta coisa cá em casa (a ver se sobrava algum dinheirito para umas férias decentes e algum neurónio que não ficasse electrocutado pelo esforço), podia não andar numa constante correria para ter a certeza que não falta nada a ninguém e poder dormir mais umas horinhas seguidas (é que cansa, bolas!). Mas também poderia ser tão pior, não era?
Conheço tanta gente a viverem dilemas que nem nunca nos passam pela cabeça. Vejo tanta gente a revirar caixotes do lixo à procura de comida. Há tanta gente no IPO que, com tanta coisa a corromper-lhes o corpo e a alma, conseguem ter os sorrisos mais belos que alguma vez vi.
Por isso -e desculpem se de alguma forma pareço um pouco insensível- mesmo que a vida não esteja a ser generosa convosco, apenas por hoje... podem por um sorriso na cara, não se queixar do que corre mal, da crise, do futebol, e encontrarem um pouco da felicidade que têm guardada lá no fundo? Só por hoje que seja... para eu me sentir um pouco menos culpada e mais normal?
Obrigada!
Se é certo e sabido que muita gente necessitava de tirar a carta de condução (e não digo renovar mas tirar já que aquilo não é saber conduzir), todos os cidadãos deveriam ter carta de peão.
Aqui há dias ia eu estrada fora com os miúdos numa coisa estranha que se chama carro, e ao circundar uma rotunda aparece-me uma viatura mais estranha chamada peão pela frente. Sim, havia passeios desimpedidos de um lado e de outro, mas a senhora achou que seria melhor encurtar caminho pelo rotunda e saltou-me para a frente do carro. Acham que se assustou? Pelo contrário! Depois de atravessar pelo meio da rotunda continuou estrada fora a CIRCULAR À MINHA FRENTE! E eu lá fui a 5 kms/h, a buzinar e a fazer sinal de luzes, já que os carros estacionados em 2ª fila não me permitiam ultrapassar aquela viatura sórdida.
Mais uma vez a senhora lá continuou impávida e serena, e só junto ao cruzamento é que decidiu encostar-se um pouco para o lado, permitindo a minha passagem, mas nem assim recorrendo àquela coisa calcetada que eu acho que serve para os peões circularem mas que pelos vistos não é de uso consensual. Claro que perante a revolta dos próprios mabecos, que na sua maturidade de quase 3 anos, não queriam acreditar no que viam, não resistimos a apelidar a senhora de 'Palhacita' e seguimos caminho guardando a indignação no bolso das calças.
Mas pior que por em risco a própria vida é por em risco a vida de terceiros, e já por diversas vezes apanhei valentes sustos em manobras de estacionamento junto à escola dos mabecos devido aos peões que circulavam com crianças (não digam que são pais ou avós porque ninguém que faça uma coisa dessas merece essa classificação) decidirem passar encostados ao carro interrompendo o sentido da marcha do mesmo. Poderiam passar em qualquer outro sítio, poderiam esperar 30 segundos (já que não serei das pessoas mais demoradas a estacionar), mas não... é muito mais emocionante colocarem em risco a vida delas e das criancinhas que nem sempre levam um pouco mais protegidas ao colo, mas frequentemente seguram-nas pela mão mais próxima ao meu carro, a servir de pára-choques.
Outra coisa que me fascina são as passadeiras. Eu sei que há locais onde, devido ao nosso excelente planeamento rodoviário não existe uma única em dezenas de metros, ou quando existe, não serve de todo as necessidades pedonais. Mas outros locais há (e não serão assim tão poucos se repararem) em que as passadeiras estão práticamente lado a lado. Costumamos circular por uma rua em que existem 2 a menos de 5 metros uma da outra, e mesmo aí há sempre um Palhacito qualquer que decide atravessar entre ambas. Juro! E como a dita rua é a subir e os marmelos atravessam logo ao início quando estamos a acelerar para fazer a subida, tal comportamento incauto acaba por originar as manobras mais estranhas por parte dos condutores. Mas pior será para os que vêm embalados a descer e que são obrigados a parar de repente porque essa maltinha não só atravessa em local impróprio como se atira literalmente para a frente das viaturas. E o condutor que se desenrasque, ora essa!
Agora se destes fenómenos muita gente se queixa, acho estranho não haver mais gente a queixar-se de um outro que também incui peões mas em igual medida, ou seja... quando circulamos como peões cuidadosos que somos e levamos com um outro peão em cima. A minha mãe tinha uma colega invisual que costumava queixar-se que os outros eram 'mais cegos' que ela, que constantemente levava encontrões ou colidia com objectos transportados por terceiros (nunca percebi bem esta expressão pois sempre me fez mais sentido dizer 'segundos', mas enfim...). Não poderia concordar mais. Já me aconteceu por diversas vezes, mas registo em particular 2 destas situações que me marcaram de uma forma especial.
Uma foi quando os mabecos tinham cerca de 10 meses, e eu aproveitei uma pausa concedida pela minha sogra para ir à Primark comprar uns trapinhos, porque atendendo ao estado de magreza concedido pela amamentação (ai que saudades), já nada me servia. Estava eu na secção das gajas quando uma troglodita recolhe uma peça de um expositor e avança em marcha-atrás. Vi-a recuar e até me desviei, mas não contei que a dita senhora decidisse depois rodopiar e acertar-me com o cotovelo em cheio no peito direito. Numa situação normal seria complicado, mas para quem está a amamentar gémeos e a fazer concorrência à Mimosa com os seus 2 litros de leite/dia, acreditem que dói. E muito! Perante um 'Ah! Desculpe!' limitei-me a ganir conforme pude e a recorrer ao banco existente no exterior da loja para tentar recuperar o fôlego.
No dia seguinte estava a ser assitida de urgência pois tanto enchia frascos com leite natoso como com sangue. E a dita senhora calculo que estivesse muito bem refastelada a disfrutar dos seus trapinhos novos. Mas queixar-me para quê? Ela pediu desculpa, certo? Isso deveria acabar com a dor e com a preocupação de poder ficar com sequelas ou poder não voltar a amamentar. Foram dias de horror, mas felizmente (até à data) parece não ter passado de um susto.
Outra situação foi mais recentemente à entrada da escola dos miúdos, e doeu-me muito mais que 200 cotoveladas...só porque não foi directamente comigo, mas com o Pandinha. Não é que eu me ache inesquecível, mas o facto de se ter gémeos chama a atenção. E há diversas pessoas que metem conversa só por causa disso. A senhora em causa por diversas vezes se mete com os meus miúdos, e tenho-a em conta como sendo uma pessoa simpática e cautelosa. Só é pena não ter aquela capacidade de raciocínio dedutivo que não se aplica apenas à matemática mas que tanto jeito dá para a vida. Recordam-se do famoso 'se X, então Y?'. Pois aplicado ao caso em concreto seria 'Se Patapon, então Pandinha!' Simples, certo? Mas eu explico melhor e traduzo em miúdos (ou mabecos, como preferirem). Sabendo que são gémeos (como ela sabe), ver um significa que o outro em princípio não andará por longe. Então porquê ver a Patapon através da porta do edifício e em vez de questionar onde andaria o outro (eu própria estava a cerca de 1 metro da porta) simplesmente abrir a porta com força?
Pois... acertou na cara do Pandinha, que não só caiu desamparado de costas no chão como ficou com um pé entalado debaixo da porta. 'Desculpe!!', ouvi eu meio abafado, pensando que ela por esta altura já o estaria a ver bem, mas afinal só perante o meu grito de súplica 'Não abra mais a porta!!' é que ela percebeu que o estava a magoar no pé. Seguiu-se novo pedido de desculpas, que não o teria visto, que apenas viu a mana. E eu ali fiquei a consolá-lo sem saber muito bem como responder. Se acho que poderia ter sido mais previdente? Acho que sim. Mas também de certeza que não o fez de propósito e erros todos cometemos, certo? O problema é que não foi comigo, mas com a minha cria, e o meu instinto maternal exacerbado e animalesco não me permitiu proferir mais que um 'Acontece, deixe lá!', por entre os dentes serrados.
Eu sei que temos de manter a calma, eu sei que nem sempre a vida é fácil e as pessoas andam meio perdidas nos seus pensamentos. Por causa da crise, por causa do amor (ou da falta dele), por causa do tempo (porque o inverno é estatisticamente deprimente, como bem comprovado pelo aumento de taxas de suicídio nesta época), ou do trabalho (da falta dele ou da dificuldade em o manter). Mas problemas também eu tenho e um deles é com palhaços! Que me perdoe o Batatinha e a Picolé mas nunca gostei de palhaços! E desculpem lá o meu mau feitio, mas só me apetece jogar fora a minha carta de peão, as minhas boas maneiras, e ir ao focinho desta gente! E depois... pedir desculpa! Claro!
...e foi com esta simples pergunta que a minha vida mudou. ''Se quero o quê???''
Para quem estava a tomar a pílula e ficou em choque por perceber que estava grávida ouvir esta pergunta logo na primeira eco não me deixou mais serena. Bem pelo contrário! Por momentos pensei que estariam a brincar, ou que seria a primeira pergunta de uma qualquer checklist manhosa de aprendizes de ecografistas (nem sei se a palavra existe e não me vou dar ao trabalho de procurar no Priberam porque a vantagem de se ter um blog também terá de ser escrever os neologismos que nos vierem à cabeça, certo?).
E com a voz meio trémula ela lá insistiu 'Perguntava se quer ter um ou dois bebés...'
'Está a brincar??' (juro que procurei dizê-lo no tom mais meigo do Mundo mas provavelmente não deve ter sido assim que saiu)
Nisto ela diz ''Não estou não...olhe! Um... dois. Está a ver?'' E eu vi! Eram 2 coisinhas minúsculas com caudinha e ar de crocodilo, que eu até duvidaria serem de origem humana, mas não havia dúvidas que eram dois.
Sei que pode parecer de pouca sensibilidade para quem há anos tenta engravidar e não consegue, mas foi também a pensar nessas pessoas que me saiu aquele mar de disparates pela boca. Com tanta gente a sonhar com ter gémeos porque raio é que aqueles mabecos me foram escolher a mim??? Logo a mim que até gostava de um dia EVENTUALMENTE ser mãe mas não me sentia ainda minimamente preparada para ser mãe de um, muito menos de dois. Até estavamos ambos (eu e o outro co-irresponsável) numa situação económica estável, até teriamos alguma maturidade (achava eu...loooool), até namorávamos há mais tempo do que a memória me permitia recuar, até tinhamos toda a gente em redor a ansiar para passarmos para esse Mundo maravilhoso da parentalidade, mas... E a crise? E as despesas que teriamos? E eu não ter logo percebido que estava grávida e ter feito os maiores disparates que poderiam ter afectado o bebé? OSSSSSS bebés!! OSSSSS bebés!!!
De imediato começaram-me a escorrer as lágrimas e eu perdi o chão. Pedi para não deixarem entrar a minha mãe e o meu sobrinho mais velho porque não queria que me vissem assim. Porque me sentia completamente perdida. Tentei limpar as lágrimas para ver o resto da eco. Afinal queria que me garantissem que eu não lhes tinha feito qualquer mal, e no meio de tanta coisa que não ouvi, recordo-me que a médica me tentou confortar a dizer que estaria tudo bem com eles.
O papá só dizia que ia correr tudo bem e que estava muito feliz e eu sentia uma dor que me trespassava por não conseguir sentir o mesmo. Ao sair e deparar com a minha mãe foi mais um mar de lágrimas. Recordo-me das palavras dela como se fosse ontem: ''Se um está a rir e outro a chorar é porque não deve ser grave.'' E não era claro, massss.... eram DOIS!! E mais uma a passar para o lado dos felizes e eu ali, com um peso cada vez maior na consciência. Nisto telefonemas para a minha mana, para a minha sogra, mais risos... e eu a achar que devia pertencer a outro Mundo.
Até que senti um abraço forte e as palavras 'Eu percebo, tia... é muita responsabilidade!' trouxeram-me para este Mundo novamente. E foi assim que um rapazinho de 13 anos me fez perceber que não estaria assim tão desfasada da realidade...