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Aventuras e desventuras de uma mamã de gémeos: Como me meti nesta enrascada; Relatos da (in)experiência; O dia-a-dia com 2 mabecos... Leiam e participem!!
Manhã de escola e eu já a desesperar ao tentar despachar os dois mabecos.
Confesso que ando um pouco destreinada pois, desde que comecei a trabalhar por turnos, é o pai que os leva à escola, e seja-lhe feita a homenagem... o gajo despacha-os em meia hora. E quando digo despachar é mesmo assim a despachar. Enquanto um vai ao wc ele veste o outro, depois trocam. Sapatos são eles que calçam, casacos são eles que vestem e para o pequeno almoço não há 'Ahhhh... e se fosse...' É! E pronto!
Eu em tempos já tive este poder. E acreditem que não é um superpoder. Como digo tantas vezes é fruto da necessidade de se ter gémeos e termos na mesma de chegar ao trabalho a horas. Mas como agora acordo de madrugada e saio de casa com o sol a raiar, só me calha a mim quando estou de folga (uma das grandes vantagens das folgas rotativas é precisamente poder deliciar-me com eles e mimá-los um pouco).
Pois... mas ter esta noção não é sinónimo de por em prática a teoria. Por um lado porque estou destreinada do regime militar, por outro porque... hmmmm... tenho saudades deles. E por isso sei que tolero um pouco mais do que devia.
Esta manhã foi um desses dias em que tenho a nítida sensação que tolerei de mais. E não é que se estivessem a portar mal... é que ele escolheu comer papa com bolacha, ela preferiu cereais, mas a dada altura ele disse que depois da papa também queria cereais, e ela pediu-me 'Uma bolachiiiiinha, mamã!' E quando dei por isso era já hora de partir e eu ainda não estava vestida.
-A mamã vai-se vestir num instante enquanto vocês acabam de comer, está bem? Qualquer coisa mais... esperam! -disse em tom decidido e algo autoritário a ver se encaixavam a ideia.
Perante o aceno de cabeças lá fui eu para o quarto convencida que tinha retomado as rédeas do poder, quando oiço uns passinhos apressados pelo corredor. Era a Patapon:
-Ó mãe! O mano diz que os meus cereais não prestam!
-Querida... ele está a comer igual por isso isso nem faz sentido ele dizer isso. E tu gostas, certo? Isso é que importa.
E nisto ela volta para a sala e oiço-a a repetir feita papagaia:
-A mãe diz que tu estás a comer igual e que não faz sentido dizeres isso. E eu gosto! OUVISTEEE?
Não passam nem 30 segundos e aparece-me lá ele:
-A mana disse que a minha papa é de chocolate e não é pois não?
-Não, não é de chocolate.
Mais passinhos plo corredor de regresso à sala e novo papaguear:
-A mãe diz que não é chocolate! Estás a mentir!
Passinhos duplos plo corredor e eu a tentar calçar os ténis. Aparecem os dois com o ar mais queixinhas do Mundo e começa a Pespineta:
-Ó mãe eu...
-Chega! -interrompo eu- Não quero ouvir mais queixinhas. Estou-me a vestir e já vou.
-Mas ó mãe!! -diz ela com um ar muito escandalizado- Eu estava a falar e tu interrompeste. Ora... não se interrompe quem está a falar pois não?
E é nestas alturas que acho que se calhar ando a educá-los demais... Meia dose de educação provavelmente chegava e dava menos chatices.
Como eu agora me levanto a horas impronunciáveis quem leva os miúdos à escola é o co-irresponsável. Confesso que de início fiquei um pouco apreensiva mas ele está a conseguir domá-los controlá-los melhor que eu. Pelo que já percebi aqui de manhã é regime militar, porque no fundo o pai continua a ter horas para entrar, e eles até acham piada. E segundo o que ele me diz é a única forma de sobreviver a dois mabecos irrequietos de 3 anos.
Por exemplo em relação ao pequeno almoço, em vez de lhes dar à escolha -como aqui a parva faz- ele simplesmente decide por eles e coloca-lhes a comida à frente com ar sério. O resultado? Comem tudo, rápido, sem brigas, sem discussões.
Pois na sexta, como estava de folga, calhou-me a mim levá-los à escola. Até me deu vontade de rir quando começaram a fazer exigências para o pequeno almoço, e a mudar de ideias 5 minutos depois. Mas lá conseguimos despachar-nos.
Chega a recta final do calçar e vestir casacos e eu pego nas botas e vou para a sala para conseguir manter a vigilância deles (quem tem gémeos ou 2 de idades semelhantes sabe que é sempre nestes momentos que eles decidem engalfinhar-se). Vira-se então a Patapon com ar admirado:
- O pai deixa-te calçar as botas na sala? Como é que podes calçar na sala!!!???? A mim diz que é no quarto...
Ter mabecos à solta por casa tem destas coisas. Qualquer aparelho com botões serve para brincar. Bem que me parecia que eles estavam muito caladinhos esta manhã enquanto eu preparava o pequeno almoço. Mas não me posso queixar já que terei café com leite imaginário para o dia todo. Estivesse o frigorífico ligado e teria ice-coffee imaginário. Felizmente tivemos o bom senso de o desligar assim que os gémeos começaram a andar e a trepar a tudo, porque vai-me saber bem melhor o café com leite quentinho do que o gelado...
Ainda uma destas manhãs o co-irresponsável se lamentava que tinha saudades de ver o noticiário de manhã. É que desde que a hora mudou (ver post 'Com sopas e bolos e fusos horários') que os gémeos ficaram presos no fuso horário anterior, pelo que é raro o dia em que não despertam antes das 6h30 e acabam assim por nos fazer companhia ao pequeno almoço e monopolizar a tv com o Miao Mao e outros tais.
Pois nem bem a propósito, pouco depois desse episódio dei por mim estrada fora a caminho do mecânico já que o carro andava a perder potência (sim, sou uma gaja estranha que repara nestas coisas, graças talvez a um instrutor de condução que sempre me ensinou a ser 'mecânica de ouvido'), e na minha demanda por entre as rádios pré-definidas no rádio (felizmente não há nenhuma 'Rádio Panda' ou 'Rádio JimJam' pelo que é tudo conteúdo de 'crescidos') oiço algo que me deixou estupefacta.
Parece que no meio de toda esta crise o Governo teve uma ideia peregrina que foi reduzir os anos das licenciaturas para tentar atingir os patamares europeus em termos de educação. E não sei porquê fiquei com uma sensação de 'dejá-ecouté' (adoro este meu neologismo)... É que a memória daqueles iluminados pode ser curta, mas a minha, embora enevoada pela magnitude de novas exigências que a maternidade acarreta, não estará assim tão limitada. No meu tempo (e lá vou eu...) as licenciaturas eram de 5 anos e os pais andavam a matar a cabeça aos miúdos com a célebre frase 'Estuda para um dia seres alguém'.
Chamem-me desconfiada ou mesmo paranóica mas fiquei com a sensação que esta 'solução' seria mais uma para 'tapar o sol com a peneira'. Semelhante àquela em que colocam desempregados em cursos de formação que pouco ou nada têm a ver com os interesses deles ou mesmo com a utilidade prática dos mesmos, mas que permitem que, mesmo que temporariamente, saiam das estatísticas de desemprego. E cheirou-me (sim, que a minha mãe ensinou-me a ser 'cozinheira de nariz') a esturro. A um esturro muito grande, a uma daquelas decisões de se pôr o lume no máximo para abreviar o tempo de cozedura e...pimba! O resultado não pode ser outro, certo? Pela minha lógica prevejo (sim, agora também sou astróloga e taróloga) um 'boom' de desempregados ainda maior. Mas a curto prazo ficam com o problema resolvido, certo?
Então e perguntam vocês... onde é que queres chegar com isto tudo?
Simples... falava da minha ida ao mecânico, lembram-se? E como o trajecto ainda é longo aproveitei para pensar em todas estas coisas da vida e na fulana que aqui há dias encontrei à porta da minha casa (é natural que se sintam ainda mais perdidos mas juro que no final do discurso delirante haverá uma luz ao fundo do túnel e não será necessariamente um comboio para vos passar por cima). Ora a dita rapariga estava à porta do meu prédio e viu-me aproximar com os miúdos. A quem tem gémeos sabe bem que é uma premissa sermos alvo de gente metediça sempre que saímos à rua, pelo que já estava à espera. Mas curiosamente...nada! Nem se meteu com os miúdos, nem sequer disse boa noite. Simplesmente fez o gesto de entrar no momento exacto em que, já dentro do prédio, fechei a porta.
Perante o ar dela de indignação resolvi (ainda dentro do prédio e de porta fechada em segurança que aqui pelas redondezas têm havido muitos assaltos que começam assim) cumprimentar a senhora e perguntar se podia ajudar. Ao que ela responde no tom mais seco do Mundo:
-Quero entrar no prédio!
Sério? Pensei eu... E eu a julgar que quando alguém se coloca do lado de fora a forçar a porta quereria era sair!! Até aí tinha eu chegado sozinha e não preciso da licenciatura. Mas aquilo não sei porquê não me parecia motivo suficiente para abrir a porta a uma perfeita desconhecida. Vai daí feita parva ainda perguntei:
-Mas quer entrar para quê? É publicidade? Se for isso tem aí uma caixa fora onde pode colocar...
Acham que ela respondeu? Não! E eu, com os miúdos já a puxarem-me escada acima ainda insisti:
-Se pelo menos me explicar ao que vem talvez a possa ajudar...
E nada! Mais uma vez permaneceu calada, com cara de caso, o que só me fez deixar ainda mais intrigada. E em tom de conclusão acabei por dizer:
-Olhe... Não leve a mal mas não posso ficar responsável pela entrada no prédio de alguém que eu não conheço e que nem sequer me diz ao que vem. Se é publicidade coloque na caixa como eu indiquei que as pessoas tiram daí. Se for para ir a casa de alguém e se já tocou e não abriram é porque a pessoa não estará em casa, pelo que também não fará sentido a senhora entrar, certo?
E lá apanhei eu o elevador, com os miudos já a engalfinharem-se, e a tal fulana caladinha à porta. Momentos depois, estavamos nós a dar banho e comer aos miúdos, tocam à porta e oiço aquela mesma vozinha. Já nem me recordo o que disse de início, apenas me apercebi que era de uma operadora de telecomunicações com a qual eu já tive contrato, mas que deixei por má prestação de serviços e em relação à qual até fiz uma reclamação para a Anacom. Claro que disso a senhora não tem culpa pois sendo de uma empresa sub-sub-contratada nem sequer tem acesso a esses dados. Mas tem culpa de ser parva. Bastava ela ter dito ao que vinha e ter-se identificado e eu tinha-lhe aberto a porta.
Vai daí comecei a pensar na situação e depois, como sou imensamente cusca, quando regressei do mecânico decidi pesquisar que tipo de perfil pedem os operadores de telecomunicações para este tipo de serviço. E para meu espanto se em alguns casos basta o 9º ano, alguns há que já pedem o 12º ano. Pudera! Se se consegue acabar a escolaridade mínima obrigatória com este nível de 'sensibilidade e bom senso', então livrem-se de contratar malta que nem ao 9º ano chegou. E foi aí que me caiu a ficha! Por este andar até podem pedir a licenciatura porque não tarda nada acaba por ser só mais 1 ano e este tipo de gente acerebrada qualquer dia até aulas dá aos nossos filhos. Ou nos arranjam os dentes, ou até quem sabe com mais 1 aninho além do primeiro tiram a especialização em obstetrícia. E será este o País que teremos... E no fundo é este o 'estado do Estado'...
Lembrei-me então do sorriso de felicidade que trazia nos lábios ao vir do mecânico (vêm como isto tudo parece que se vai conjugar em algo com sentido??), que me poupou o coração apenas por ir dar uma volta de carro comigo e dizer, por entre risos, esta bela frase:
-O que o seu carro tem é carvão dentro da tubagem de você andar tão devagar com ele. Vá lá para casa descansada e puxe mas é pelo carrinho de vez em quando, que ele está a precisar.
(Diga-se a bem da verdade que quando nos tornamos pais ganhamos velocidade de lesma e se bem que tenhamos alguma consciência disso, dizerem-nos assim na cara faz-nos doer o ego, mas serena-nos o coração de que estaremos a agir correctamente)
Certo... ele resolveu o problema e não me levou nada porque até é uma pessoa séria. Mas acima de tudo é um bom mecânico, uma pessoa educada e prestável, e não me parece que seja licenciado. E se andasse a pregar ligações de fibra por entre as portas duvido que não tivesse o discernimento suficiente para dizer boa noite e explicar ao que vinha. Também o senhor que cá vem arranjar os estores é uma pessoa extremamente competente, ganha rios de dinheiro, e nem por isso deixa de ser alguém com quem se consegue ter uma conversa. Porque há coisas que fazem parte da educação base de uma pessoa, certo? Ou já não?
E por entre todo este raciocínio dei por mim a rezar para que os meus mabecos não queiram ser estudiosos mas sim inteligentes. Será caso para dizer 'Não estudes! Tenta mas é ser alguém!'